Muitos motoristas são surpreendidos ao receber uma multa de trânsito, e por não saber como agir, acabam arcando com o seu pagamento e pontos na CNH.
Há casos em que o motorista sequer tem conhecimento da infração que lhe é imputada, somente vindo a conhecê-la quando da renovação anual do licenciamento.
Para isso, venho esclarecer algumas dúvidas rotineiras que observo na prática.
Previsão legal
Primeiramente, é preciso saber que toda autuação de trânsito é passível de recurso.
Ou seja, sempre que o motorista não concordar com a autuação, possui o direito de apresentar defesa administrativa para buscar a anulação da multa ($$$) e dos pontos na CNH.
Isso porque o auto de infração pode conter uma série de irregularidades que o tornem irregular, o que acarreta na sua nulidade plena.
Imagine a seguinte situação: um motorista é parado em uma blitz e lhe é solicitado a fazer o teste do etilômetro (bafômetro).
O motorista aceita fazê-lo.
Esse condutor sabe que não ingeriu bebida alcoólica nas últimas 24 horas. No entanto, o teste realizado acusa álcool no sangue.
Indignado, o motorista procura um advogado para recorrer da multa.
O profissional consulta o aparelho utilizado na abordagem e verifica que o mesmo não estava devidamente aferido, nem possuía registro no INMETRO.
Além disso, observa que o auto não possui uma série de requisitos legais indispensáveis à regularidade da autuação.
Nesse caso, é evidente que o auto de infração está viciado, ou seja, contém falhas que o tornam irregular/ilegal.
Visando a sanar falhas como a acima narrada, a Constituição Federal estabeleceu, em seu art. 5º, LV, o seguinte:
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
[…]
LV – aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes;
Dessa forma, é assegurando a todo e qualquer litigante o direito ao contraditório e à ampla defesa, seja em processo judicial ou em processo administrativo, sendo dispensável o reconhecimento da culpa.
Se até mesmo no direito criminal, em que o réu é confesso, existe a possibilidade de defesa e absolvição, por que seria diferente no direito administrativo (multa de trânsito)?
Como funciona o recurso de multa?
Primeiro passo:
A primeira coisa a se fazer ao tomar conhecimento de uma infração de trânsito é verificar:
- Se aquela autuação de fato ocorreu;
- Se as informações descritas estão corretas;
- Se todos os campos estão devidamente preenchidos;
- Se concorda com a autuação;
- Se existe prazo para defesa/recurso.
Há vários argumentos que podem ser trazidos na defesa, sendo tanto questões de mérito, ou seja, sobre o fato ocorrido, quanto questões formais, que são as inconsistências no próprio auto de infração de trânsito.
Vejamos alguns exemplos de nulidades: recebimento da notificação fora do prazo limite estipulado pela legislação, radar com validade de aferição vencida, informações incompletas do local e data da infração constatada, tipificação incorreta da infração, etc.
Aqui se observa que, mesmo com a existência de culpa, as inconsistências do auto de infração de trânsito podem levar à sua anulação.
Dessa forma, independentemente de culpa pelo motorista, a possibilidade de recorrer de uma multa de trânsito é uma garantia constitucional, conforme art. 5º, LV, da Constituição Federal.
O contraditório e a ampla defesa são garantias de todo cidadão, garantindo-lhe a possibilidade de contar a sua versão dos fatos e apontar eventuais erros formais por parte do agente autuador na elaboração do auto de infração.
Benefícios de recorrer administrativamente de uma infração de trânsito
Como vimos, recorrer de uma infração de trânsito é direito de todo cidadão, assegurado pela Constituição Federal.
Segundo os artigos 285 e 286 do Código de Trânsito Brasileiro, é possível entrar com recurso de toda penalidade aplicada, sem a necessidade de pagamento prévio da multa.
Além disso, enquanto estiver em fase de recurso, nenhuma penalidade poderá ser aplicada.
Caso a defesa/recurso seja aceita, isso implicará na anulação das penalidades, como multa, pontos na CNH, suspensão, cassação da CNH, etc.
Posso recorrer mesmo quando a infração foi cometida?
Não é à toa que a legislação de trânsito prevê uma série de requisitos para a validade do auto de infração, pois, como todo ato humano, mesmo um agente de fiscalização pode cometer erros.
Mais uma vez fazendo referência ao Direito Criminal, quantos casos você já ouviu falar de réus que foram condenados, passaram anos presos, e depois de anos se descobriu que o crime foi cometido por outra pessoa?
É para evitar falhas como essa que existem os mecanismos legais de defesa.
O objetivo principal do CTB é orientar os integrantes do trânsito, e manter a harmonia social, não necessariamente puni-los.
As multas de trânsito servem para chamar o condutor à razão, à reflexão sobre os seus atos enquanto motorista, para que os desvios na direção não se repitam.
As multas de trânsito são importantes para, sobretudo, firmar o propósito de manter a segurança no trânsito.
Portanto, saiba que você sempre poderá contestar uma autuação de trânsito quando julgar necessário.
Assim, também estará contribuindo para que o sistema de trânsito seja eficaz.
Para isso, consulte sempre um profissional capacitado e com conhecimento na área de trânsito, já que existem dezenas de áreas do conhecimento, sendo impossível que um advogado se especialize em todas elas.